ROSA CHADANIAN,, ARGENTINA DE BUENOS AIRES TRANSFORMOU AOS 74 ANOS O SONHO EM REALIDADE, DEPOIS DE VÊ-LO FRUSTRADO QUANDO TINHA 16 ANOS |
Todos nós temos tipos inesquecíveis de pessoas fora de nossos vínculos consanguíneos ou do círculo de amigos. Eu mesmo, tenho alguns, mas vou me deter em alguém que conheci em Uruguaiana, na fronteira do Brasil com a Argentina. A noite, no bar, naquele julho de 2012 tinha tudo para ser apenas mais uma em que me divertiria, mais ouvindo as baladas do artista que cantava ao vivo na casa noturna bem frenquentada, na esquina entre as ruas Andradas e Vasco Alves, hoje desativada.
Com meus pensamentos mergulhados na taça de vinho argentino, famoso pela boa qualidade, muito comum de encontrar nas noites de inverno da cidade, vi alguém avançar dançando para a pista vazia. A figura, na penumbra e salpicada por raios coloridos emitidos por um pequeno aparelho de efeitos luminosos, era de uma senhora de aproximadamente 70 anos. Ela dançava solitária, com leveza e graça, entregue à magia da noite, o que chamou atenção dos demais frequentadores.
Elegantemente vestida usando roupas pretas com blazer de corte até à cintura e de tecido brilhante, dançava consigo mesma como se estivesse na ribalta. Deduzi que estava diante de alguém com talento para brilhar, ao estilo de grandes vedetes. Quando saiu da pista, não me contive e aplaudi o que o pequeno grupo de notívagos também o fez. Passou pela mesa onde eu estava e me cumprimentou com leve menear da cabeça. Pude ver que era uma senhora ruiva, de cabelos crespos e de olhos azuis que sentou-se à mesa perto da entrada do bar. Estava acompanhada por um senhor que depois descobri ser irmão dela.
A DAMA QUE GOSTA DE DANÇAR É UMA INCRÍVEL ARTISTA PLÁSTICA |
Ao verem a dama voltar para a pista, quase todos não resistiram, inclusive eu, e se juntaram a ela, contagiados pela alegria de viver daquela senhora. Quando paravam de dançar, ela ficava ainda mais um pouco, sempre no mesmo ritmo suave e solitário, interagindo com todos junto às mesas. Dançamos separados, vez em quando, ao longo da noite. Bebemos e conversamos, eu, ela e o irmão. Eram argentinos, de Buenos Aires. Ele mora em Uruguaiana e ela na capital porteña. Depois daquela noite nunca mais a vi.
Julho de 2015. Havia mudado de endereço para a Rua vasco Alves, onde funciona o estabelecimento comercial do irmão, na esquina com à Rua General Câmara. Roberto Chadanian estava sentado na calçada oposta do prédio onde vende móveis e utensílios usados. Ao seu lado, estava Rosa Chadaniam. Nosso reencontro foi inesperado. Ela estava animada e tratou logo de mostrar o projeto em que estava envolvida.
Era a Exposição Sonho e Realidade, uma mostra de sua autoria com mais de 20 belas telas pintadas com a utilização de várias técnicas. - A senhora é artista plástica?- perguntei, surpreso, enquanto olhava as fotografias de seu portfólio. - Sim, sou autodidata e pinto desde criança - afirmou. Dona Rosa estava definindo os últimos detalhes para a exposição de suas obras no Salão do Serviço Social do Comércio de Uruguaiana, o que levou a cabo no período de 4 a 29 de setembro com noite de abertura prestigiada por amigos brasileiros e argentinos.
NO CONVITE, O NOME DA EXPOSIÇÃO DE ROSA, UMA ALUSÃO AO SONHO QUE TORNOU REAL |
Ela estava radiante porque realizara um sonho, expressão contida na denominação da mostra e isso tem uma origem. Aos 14 anos, Rosa havia realizado a primeira exposição em que vendeu todas as telas em Buenos Aires. Aos 16 anos, um marchand italiano a convidara para se aperfeiçoar em renomada escola de artes do país, mas Rosa fora proibida pela mãe, receosa em deixar a filha partir. Frustrada, a menina nunca mais pintou. Nos últimos seis anos, com quase 70, a artista que estava latente, falou mais alto e Rosa voltou a manusear pincéis, tintas e telas. De sua verve, brotaram belíssimas obras à óleo e acrílico. Usando cores vivas, pintou obras de seu imaginário com temática variada. Natureza, animais, borboletas e belas paisagens impressionam por serem todas únicas. A mensagem que meu tipo inesquecível, a dama que baila solitária nos salões deixa é de que nunca é tarde para realizar um sonho em vida.