CRÔNICAS DE UM CRONISTA CRÔNICO
O
FRIO DÓI
César
Fantti
“Viu como o inverno é frio
pai?” perguntava meu pequeno Gabriel aos seis anos quando o levava para a
escola. – Sim, meu filho, assim como o Verão é quente e as meias estações são
amenas. Hoje, passados 14 anos não poderia dar a mesma resposta. Neste ano de
2016, o frio começou já ao final de abril, portanto, completamente fora de
época. O clima mudou no Planeta, disso ninguém tem dúvida. As estações não são mais
o relógio do tempo.
O certo é que no inverno
mudamos de nosso habitat convencional para dentro do freezer. Tudo fica mais
frio, inclusive muitas pessoas. O frio dói, faz sofrer em determinadas
situações. Na hora do banho quem não tem ajuda providencial de um aquecedor ou
qualquer tipo de calefação entra em um ambiente inóspito. Tudo em que se toca é
gelado. O corpo se contrai, os pelos se eriçam e até os mais machões veem sua
virilidade diminuir. O martírio se torna maior quando abrimos o chuveiro para
nos refugiar sob a água quentinha, mas até a maldita ducha está congelada e
demora a aquecer.
-Essa droga vai me
deixar na mão logo agora? - soltamos, entre dentes, essa e outras imprecações.
Finalmente, um zumbido mais forte e a fumacinha que sai da água indica que o sofrimento
acabou. Entramos, aliviados para o êxtase do banho quente, para a higienização
do corpo tão necessária. A água desce descontraindo músculos, tendões, artérias
e a pele. Agora, mergulhados nesse mundo tão renovador, não queremos mais
voltar para o outro lado, pensamos na conta de luz, mas naquele momento isso
não é o mais importante. É quando à resistência falha e um jato gelado nos
atinge voltando a nos lembrar que o frio dói.
Pulamos fora, de volta ao
ambiente agressivo de onde saímos e nos refugiamos na toalha gelada. Queremos
fugir daquela experiência frustrante. De corpo seco e com a roupa de dormir,
nossa última esperança é a cama quentinha onde nosso amor, que não passou pelo
mesmo drama, nos espera aquecida. Porém, ao entrar no quarto também sem
calefação, as cobertas estão geladas em nosso quadrante da cama, mas ela,
solidária, nos diz com voz convidativa: - me abraça de conchinha amor - ao que
atendemos prontamente. Após encontrarmos, finalmente, um ambiente ideal vem um
novo choque: o amor encosta duas pedras de gelo em nossas pernas. Seus pezinhos
nos fazem lembrar, de novo, que o inverno dói. A última, derradeira e delirante
saída é fazer sexo, trocar calor, puxando as cobertas para não deixar a
preciosa calefação biológica escapar.
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