sexta-feira, 10 de junho de 2016







CRÔNICAS DE UM CRONISTA CRÔNICO


O FRIO DÓI
César Fantti

“Viu como o inverno é frio pai?” perguntava meu pequeno Gabriel aos seis anos quando o levava para a escola. – Sim, meu filho, assim como o Verão é quente e as meias estações são amenas. Hoje, passados 14 anos não poderia dar a mesma resposta. Neste ano de 2016, o frio começou já ao final de abril, portanto, completamente fora de época. O clima mudou no Planeta, disso ninguém tem dúvida. As estações não são mais o relógio do tempo.

O certo é que no inverno mudamos de nosso habitat convencional para dentro do freezer. Tudo fica mais frio, inclusive muitas pessoas. O frio dói, faz sofrer em determinadas situações. Na hora do banho quem não tem ajuda providencial de um aquecedor ou qualquer tipo de calefação entra em um ambiente inóspito. Tudo em que se toca é gelado. O corpo se contrai, os pelos se eriçam e até os mais machões veem sua virilidade diminuir. O martírio se torna maior quando abrimos o chuveiro para nos refugiar sob a água quentinha, mas até a maldita ducha está congelada e demora a aquecer.


-Essa droga vai me deixar na mão logo agora? - soltamos, entre dentes, essa e outras imprecações. Finalmente, um zumbido mais forte e a fumacinha que sai da água indica que o sofrimento acabou. Entramos, aliviados para o êxtase do banho quente, para a higienização do corpo tão necessária. A água desce descontraindo músculos, tendões, artérias e a pele. Agora, mergulhados nesse mundo tão renovador, não queremos mais voltar para o outro lado, pensamos na conta de luz, mas naquele momento isso não é o mais importante. É quando à resistência falha e um jato gelado nos atinge voltando a nos lembrar que o frio dói.


Pulamos fora, de volta ao ambiente agressivo de onde saímos e nos refugiamos na toalha gelada. Queremos fugir daquela experiência frustrante. De corpo seco e com a roupa de dormir, nossa última esperança é a cama quentinha onde nosso amor, que não passou pelo mesmo drama, nos espera aquecida. Porém, ao entrar no quarto também sem calefação, as cobertas estão geladas em nosso quadrante da cama, mas ela, solidária, nos diz com voz convidativa: - me abraça de conchinha amor - ao que atendemos prontamente. Após encontrarmos, finalmente, um ambiente ideal vem um novo choque: o amor encosta duas pedras de gelo em nossas pernas. Seus pezinhos nos fazem lembrar, de novo, que o inverno dói. A última, derradeira e delirante saída é fazer sexo, trocar calor, puxando as cobertas para não deixar a preciosa calefação biológica escapar.




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